Resenha: A Resposta, de Kathryn Stockett

by - quinta-feira, março 17, 2016

Eu vi o filme Histórias Cruzadas por causa de Viola Davis. Achei um filme bom, me fez chorar, adoro a Viola. Aí eu peguei o livro A Resposta para ler. Queria dar um tempo na ficção científica e aquele livro vinha me olhando do livreiro fazia tempo. Como eu já conhecia a história do filme, o livro me intimidava. Taí a palavra certa. Não sei bem o que vai ser dessa resenha...





Sinopse:
Uma história de otimismo ambientada no Mississippi em 1962, durante a gestação do movimento dos direitos civis nos EUA.

Eugenia Skeeter Phelan acabou de se graduar na faculdade e está ansiosa para tornar-se escritora, mas encontra a resistência da mãe, que quer vê-la casada. Porém, o único emprego que consegue é como colunista de dicas domésticas do jornal local. É assim que ela se aproxima de Aibellen, a empregada de uma de suas amigas. Em contanto com ela, Skeeter começa a se lembrar da negra que a criou e, aconselhada a escrever sobre o que a incomoda, tem uma ideia perigosa: escrever um livro em que empregadas domésticas negras relatam o seu relacionamento com patroas brancas.

Mesmo com receio de prováveis retaliações, ela consegue a ajuda de Aibileen, empregada que já ajudou a criar 17 crianças brancas, mas chora a perda do próprio filho, e Minny, cozinheira de mão cheia que, por não levar desaforo para casa, já esteve por diversas vezes desempregada após bater boca com suas patroas. Uma história emocionante e estarrecedora onde a cor da pele das pessoas determina toda a sua vida. Um livro que, devido ao seu tema, chegou a ser recusado por quase sessenta editoras antes de ser publicado.

(Skoob)

O livro

O livro é narrado pelo ponto de vista de três personagens: Minny, uma empregada negra que é conhecida por ser uma excelente cozinheira, sempre falar demais e que perdeu o emprego diversas vezes por causa disso; Aibileen também negra, que já cuidou de dezessete crianças brancas e Skeeter, branca, que acabou de voltar da faculdade e que quer ser escritora. Todas elas vivem em Jackson, Mississippi, nos anos 60, uma época de profunda segregação racial.

As três parecem parceiras improváveis, especialmente porque Skeeter é branca, convive com as mulheres da sociedade de Jackson, enquanto as empregadas negras são relegadas a situações humilhantes e degradantes, sem salário mínimo e sem direito ao serviço social. Têm jornadas penosas, não podem usar o banheiro das casas onde trabalham, são vistas com desconfiança por patrões racistas. Precisam usar um banheiro pequeno e abafado na garagem porque são vistas como "sujas e transmissoras de doenças" (!).

Skeeter sonha em ser escritora, mas tudo o que consegue é um emprego no jornal local, escrevendo a coluna de limpeza e cuidados domésticos. Como não entende disso, acaba pedindo a ajuda de Aibileen, que lhe passa todas as dicas e soluções caseiras para uma série de problemas, como manchas na roupa, nos móveis. Aí, depois de receber um conselho de uma editora de Nova York, ela tem a grande ideia que norteia todo o livro: escrever um livro sob a perspectiva das empregadas e de como elas viam a sociedade de Jackson.

O que me faz lembrar de uma coisa em que não quero pensar: que a dona Leefolt tá construindo um banheiro pra mim porque acha que eu tenho doenças. E a dona Skeeter me pergunta se eu não quero mudar as coisas, como se mudar Jackson, Mississippi, fosse o mesmo que trocar uma lâmpada.

(Aibileen)

Skeeter, por sua vez, não esperava se confrontar com tantos privilégios que ela mesma nunca enxergou e do racismo que comete, mesmo que sem querer ou perceber, como quando ela sugere que a Aibileen vá até a biblioteca pública para retirar livros e Aibileen a lembra que negros não podem entrar lá. O projeto começa como um mero livro com várias biografias, mas ela não entende, em princípio, porque Aibileen não pode ser vista conversando com ela, nem recebendo-a em casa. Aquela era uma época em que um negro poderia ser morto ou espancado na rua apenas por estar ali. Ela não entende a raiva de Minny, que é sempre curta e grossa em suas observações. Na primeira vez que Aibileen conversa com Skeeter, ela passa mal e vomita. Cena que não está no filme.

Praticamente todas as personagens brancas são racistas, incluindo Skeeter. Skeeter começa a perceber seus próprios erros e tenta se policiar, aprendendo com Minny, com Aibileen e com as outras empregadas que se dispõem a ajudar. Mas nem tudo são flores. Uma das empregadas diz para Skeeter que ela é odiada e que seu projeto é só um engodo. Skeeter teme por todas as mulheres que estão contribuindo para o projeto, pois ela sabe que sua cor não é problema. O máximo que acontece com ela é ser excluída da sociedade de Jackson. Já para as negras, a morte, o espancamento, o despejo, a demissão, são presenças frequentes.

Histórias furiosas brotam, de homens brancos que tentaram tocá-las. Winnie conta que foi forçada inúmeras vezes. Cleontine disse que se debateu até tirar sangue do rosto do agressor, e que ele nunca mais tentou. Mas a dicotomia de amor e desprezo vivendo lado a lado é o que me surpreende. A maioria é convidada para o casamento das crianças brancas, mas só se for de uniforme. Essas coisas eu já sei; no entanto, ouvi-las da boca da pessoa de cor é como ouvi-las pela primeira vez.

(Skeeter)

Cena do filme Histórias Cruzadas. Minny, Aibileen e Skeeter.

Avaliação

Viola Davis foi muito criticada por ter protagonizado a empregada Aibileen. Uma atriz de sua importância e de seu talento, interpretando uma empregada em uma época de intensa segregação parecia ser algo indigno dela, que ela estava perpetuando um estereótipo clichê demais. Em uma entrevista, Viola conta que sua avó foi empregada em fazendas de algodão no sul, que sua mãe foi empregada por muitos anos e que conversou muito com sua mãe para poder dar vida a Aibileen.

Você só está reduzido a um clichê se você não humanizar um personagem. (...) Eu a vi em uma jornada. Eu a vi tendo humor, coragem e inteligência. Eu a vi numa dualidade. E é isso o que eu procurei acima de tudo. Porque, geralmente, é isso o que está faltando.

Viola Davis

A autora Kathryn Stockett também recebeu várias críticas, de tentar fazer o livro ser sobre segregação racial, sobre personagens negras e de ser mais uma branca tentando escrever sobre personagens negros e tornando-se um best-seller. Há vários pontos válidos aqui. Quando um negro escreve um livro sobre o assunto, ele dificilmente vira best-seller, mas uma branca vira. De repente, todos a ouvem. Mas o livro não é sobre a segregação racial nos anos 60. São três mulheres que decidiram escrever um livro. Vamos de uma narrativa para a outra, vendo o ponto de vista de cada uma. E temos muitos assuntos sendo tratados:

  • violência doméstica
  • supremacia branca
  • violência de gênero
  • racismo
  • falta de empregos para mulheres

A autora coloca no final:

(...) não pretendo pensar que sei como era ser uma mulher negra no Mississippi, sobretudo nos anos 1960. Acho que é algo que uma mulher branca que paga o salário de uma mulher negra jamais poderá entender completamente. Mas tentar entender é vital para a nossa humanidade.

O livro é isso: uma tentativa de uma mulher branca de contar uma história. E ela conseguiu, o livro é bom. Mas também é sobre uma mulher branca enfrentando seus privilégios por ser branca em uma sociedade profundamente racista. O filme deixou de fora muitos aspectos profundos de Aibileen e de Minny e de todas as outras empregadas do livro e sei que a autora apenas arranhou as questões de segregação, porque não era esse o assunto do livro. Assim como Toda a Luz Que Não Podemos Ver não é um livro sobre a Segunda Guerra Mundial.


No mais, sei que ter gostado do livro e ter me emocionado com ele também envolve meus privilégios enquanto branca. Privilégios esses que, assim como Skeeter, eu preciso ver, porque privilégios são transparentes. E preciso desconstruir o meu racismo todos os dias. Nós crescemos nessa sociedade que não é tão diferente daquela que vemos em Jackson, Mississippi. Se Skeeter aprendeu algo com os depoimentos que recebeu, a gente também pode aprender. Quatro corujas para o livro.

Título original: The Help
Editora: Bertrand Brasil
Páginas: 573
Ano de lançamento: 2012

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4 comentários

  1. Olá, meninas. Tudo bem? Indiquei vocês para participar da Tag Liebster Awards. Conto com a participação de vocês. =)
    http://maratonistasdesofa.blogspot.com.br/2016/03/tag-liebster-award.html

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  2. Olá, estou lendo esse livro (falta poucas páginas pra acabar na verdade), e navegando pela internet me deparei com a sua crítica. Parabéns! Que ponto de vista primoroso, quisera eu que metade das pessoas do planeta pensassem como vocês!

    Continue seu excelente trabalho.

    Beijos

    Carolina Conceição

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  3. Parabéns pela resenha! Estou lendo o livro e também estou gostando muito!

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  4. Sua resenha é pertinente. O livro não se aprofunda na questão do racismo. The Help é uma história sobre uma mulher que vive numa sociedade racista comodamente até se deparar com questões que sempre estiveram presentes mas que passaram completamente despercebidas para ela até começar a interagir com as empregadas negras.

    Quero destacar aquela em que a mãe da Stecke revela o motivo da demissão da empregada doméstica e babá da Skeeter; foi tão revoltante e odioso. O mais chocante de tudo é que muitas das situações narradas no livro ainda são comuns nos dias de hoje.

    No final o saldo é positivo.

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